Sobre limites, bananas e amor
/Eu não sei o caminho certo para dar limite às crianças. Sinceramente, não sei. Já testei muito, já conversei muito e já li demais sobre isso – inclusive guias que te apresentam uma lista de três ou quatro itens certeiros para por em prática. Não é simples. Sempre me pareceu fazer sentido a ideia de que é preciso saber a hora de determinar, decidir pelas crianças, mostrar, de fato, os limites, inclusive como uma forma de carinho e cuidado. Se eu não fizer agora, a vida fará na marra depois, e aí pode ser muito pior... Muito melhor se as regras, os nãos, os limites nascerem de quem nos ama imensamente.
Mas eu – e acho que uma geração inteira de mães – convivo com outro elemento que pesa nessa hora: a culpa. É tanta informação, tanta orientação, tanto cuidado para não violentar as crianças, não desrespeitar sua individualidade e seus processos de crescimento que, às vezes, me vejo de mãos atadas, morrendo de medo de tomar qualquer atitude. E seu eu traumatizar o menino?
Numa tarde dessas, ele disse que queria comer banana, mas queria quente. Isso é novidade, e aí eu confirmei: “quer quente mesmo?”. “Sim!”, todo entusiasmado. A tia parou o que estava fazendo e foi lá fazer uma bela de uma banana quente. Docinha, cheirosinha! Bastou chegar na frente dele com o prato para começarem aqueles arrancos e voltas em torno do próprio eixo - que só quem tem criança pequena entende - e uma repetição de frases irritantes: “não quero mais; não gosto; tá muito quente”. Eu tentei, e a tia também tentou, contornar a situação de todo jeito, mas ele insistia em dizer “não gosto de banana quenteeeeee”.
Eu não tinha muita certeza do que fazer – nunca tenho! – e, em princípio, acho o fim da picada obrigar alguém a comer qualquer coisa. Mas naquela hora achei que devia tentar falar com ele sobre duas questões: se negar a experimentar novidades (e sair perdendo imensamente por isso) e não agradecer a quem, de verdade, fez tudo o que podia para te agradar. E não fez porque cismou – fez porque você pediu. Aí, apesar das caretas e dos solavancos, tirei ele de perto do público (público sempre atrapalha) e insisti pra que comesse.
Ele disse que estava muito quente e eu, do jeito que deu, mostrei que não estava. Ele cuspiu a primeira garfada, e eu aproveitei que estávamos na grama e disse: “ok, quer cuspir essa também?”. Ele mastigou e engoliu. Na quarta garfada, passou a abrir a boca sozinho. Na quinta, projetou a boquinha pra frente, e reclamou que eu estava demorando. Deu um risinho. E lá pelas tantas, com uma carinha sem vergonha, antes de a banana acabar, disse: “mãe, posso te falar uma coisa?”. “Claro!” E aí, sem traumas, veio a surpresa: “eu te amo, mãe”.