Tão mãe quanto você

Dominik Martin/unsplash.com

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É sempre um perigo ser mal interpretada, então vou começar pelo óbvio: claro que eu sei do enorme benefício que é pra um bebê ser alimentado exclusivamente no peito e também sei da importância de um parto humanizado. Sei que promovem uma espetacular conexão entre mãe e filho, sei que ambos os casos dão à mulher uma oportunidade ímpar de conhecimento e apropriação de seu próprio corpo... Sei que essa precisa ser uma bandeira hoje. E sei o quanto é fundamental para uma mulher poder fazer suas escolhas sem a influência de terceiros - seja a família, o obstetra ou o sistema. Mas é exatamente sobre escolhas que eu quero falar. Essas escolhas - quem tem um filho sabe, ou devia saber - não são assim tão simples, A mais B, preto no branco. 

O que os muito bem intencionados defensores do parto normal e do pacote que vem com ele parecem não notar é que, tão aflorada é a defesa, que, por vezes, beira o ataque. Parecem desconsiderar que existem circunstâncias - e limitações. Isso eu garanto. E as circunstâncias fazem com que as escolhas e os caminhos de uma pessoa jamais possam ser comparados com os de outra... E a campanha pela liberdade de escolha, de repente, vira pressão e alimenta a culpa - sentimento já tão comum no universo materno. Será menos mãe quem tiver, lotada de amor, precisado ou optado por receber seu filho com intervenção cirúrgica? Significa que está desconectada de si e guiada por uma força que não é sua e não é real? E se o leite não for tão abundante como garantiram que seria? Só se frustra quem idealiza.

O fato é que amor, conexão e afeto - e a formação do caráter de uma pessoa - não são determinados por quanto tempo se mamou no peito ou de que forma se nasceu. Tudo isso conta, mas a equação é muito mais complexa do que isso. Me assusta perceber no discurso de centenas de mulheres que querem o direito de escolher o julgamento e o preconceito diante das escolhas e histórias de outras. Pior ainda é o preconceito com relação ao futuro das próprias crianças. Tenho aqui dois filhos e duas histórias: é justo julgar o potencial de cada um em função das minhas circunstâncias? Eles serão melhores ou piores pessoas porque mamaram mais ou menos tempo no peito ou porque nasceram de parto normal ou cesariana? Já pensaram no peso que essas ideias, ainda que veladas, podem fazer sobre os ombros de uma mãe que está se desdobrando para dar o melhor de si?

Não existe cartilha. Nem sempre vai ser como se quer. E algumas das mais tocantes histórias de maternidade que eu conheci nos últimos anos sequer envolvem parto e amamentação. E aí? Tão mães como cada uma de nós. A mim, o que empodera é o olho no olho, a cumplicidade, o “eu te amo” dito de graça, sem qualquer contexto e com o sorriso mais lindo do mundo no rosto. Que lutemos pelo direito de respeitarmos a nós mesmas e aos nossos filhos.

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