O menino e o tempo


Caiu em minhas mãos esses dias, por pura sorte minha, um livro chamado "O menino e o avião". Poesia pura que, sem dizer uma palavra sequer, conta a maravilhosa história de um menino e seu avião de brinquedo. As imagens simples do livro não me saem da cabeça, como que um alerta para o óbvio: não precisa de muito. Não precisa de um milhão de cores e nem de peripécias inexplicáveis pra arrebatarmos corações e tratarmos do essencial: o correr da vida. O livro, que repito, não tem texto, dá asas à imaginação e trata com doçura da necessidade e do bem que fazem a calma e perseverança - valores que a qualquer deslize nos escapam e que, dado nosso contexto, parecem cada vez mais difíceis de transmitir.

Meu menino, fruto que é deste mundo, e criança que é, não quer esperar. Tem pai e mãe atentos, mas a pressa também vitimiza a gente, que tem contas a prestar, quer queiramos ou não. É muito comum que fique bravo porque quer tudo já e, principalmente, que fique bravo consigo mesmo quando alguma coisa sai fora do esperado e é preciso tentar de novo, e de novo, e de novo. Crescer nunca foi tarefa simples, mas no nosso mundo eletrônico e de superestímulos, é muito mais fácil partir pra outra, deixar de lado o que exige dedicação e apertar um botão qualquer... Soluções instantâneas estão por todo lado, é só procurar!

Fontes diversas me dizem que esse desafio não é exclusivamente meu. Paciência é algo que se treina, mas como treinar paciência em um mundo montado para ser rápido, ágil, fugaz? Como ensinar calma e perseverança se o que temos em volta é uma imensa pressão para acertar sempre, e acertar logo, porque o tempo urge, porque “todo-mundo-tá-aprendendo-a-fazer-tudo” e é melhor arrumar de uma vez uma vaga nessa corrida por um lugar ao sol… “Arrumar uma vaga” aos 3 anos? Acertar o traço com giz de cera?

E justo quando eu me dedicava aqui a pensar numa forma de ajudá-lo a ver a necessidade e as vantagens do passo sereno e persistente, o menino e o avião me seguram em terra firme e me sacodem ternamente. Pense em qualquer coisa de fato relevante no que diz respeito à educação de um criança e note: não é da noite para o dia. Não é da noite para o dia que elas construirão seu futuro e nem tão pouco é num estalar de dedos que conseguiremos mostrar o quanto vale cada um desses passos. O menino do livro perde seu avião e dedica-se a um projeto de vida inteira para recuperá-lo. Por 15 minutos, essa foi também a ocupação do meu menino, que sorriu, sentiu a perda do brinquedo e pensou alto soluções para ajudar o personagem. Anos depois, o contexto é outro, mas ambos sabem claramente o sentido da caminhada... 

"O menino e o avião", do norte-americano Mark Pett, foi publicado no Brasil pela wmf martinsfontes.

Leia também: