Por que vale a pena insistir
/A julgar pela cena no elevador, era pra voltar pra casa correndo. O menino, comprido como os meninos de quase 5, chorando alto, escandalosamente, no colo, porque tinha se recusado a sair de casa andando; o menor, no carrinho, chorando noutro tom, gritando “boím, boím”, porque queria fazer bolinha de sabão naquele exato momento, enquanto a mãe, uma só, tentava empurrar o carrinho pra porta fechar e a tão esperada portaria chegar. Nós íamos tomar ar, e só chegamos lá em baixo graças à gentileza do casal de vizinhos que fechou a porta e, ao menor sinal de explicação por parte da mãe, respondeu sorrindo: “tem dia que é assim mesmo”.
Pois é, tem. Naquele dia eu tinha decidido que precisávamos de um passeio matinal porque todos tinham acordado cedo, inclusive a TV, ligada há tempo demais pros nossos padrōes, e todos, cada um do seu jeito, davam sinais de saturação. O menino jogado no sofá sem responder a perguntas básicas, o bebê andando em círculos, resmunguento e trocando de desejo a cada segundo, e a mãe sem repertório e quase sem paciência. E o sol lá fora. “Mas eu não vou fazer naaaaaaada. Não vou brincar de naaaaadaaaa”, advertiu o menino quando a TV foi desligada contra a vontade dele.
Depois que a porta do elevador abriu, ainda no meio da gritaria, eu fiquei pensando se aquilo fazia sentido, e se eu não estava me expondo demais. Sei que nem sempre a criança enxerga suas próprias necessidades, e sei que cabe a mim agir nessas horas, ainda que custe algumas lágrimas e desaforos, mas haja paciência. E haja resistência... Eu podia ficar quieta em casa, rever meus próprios julgamentos e me importar menos com o que seria daquela manhã. Mas, na inércia, estacionei o carrinho na área livre do prédio, cumprimentei outros dois vizinhos bem menos solícitos que os do elevador, e coloquei o bebê no chão, agora livre pra fazer “boím”. O menino seguiu de cara feia e, dentre outras coisas, disse pra quem quisesse ouvir que a mãe dele é “muito chata”. Mas podemos dar um salto de 30 minutos nesta história. Meia hora depois, sem que eu tenha visto exatamente como, os dois corriam e gargalhavam juntos atrás das bolinhas de sabão e inventavam pistas de todo tipo pros carrinhos que eu tinha levado no bolso. E tomavam sol.
Eu fiquei sentada no chão vendo aquela cena, e, enquanto repetia pra mim mesma que sempre vale a pena, ganhei um beijo surpresa na bochecha: “mãe, a gente pode brincar de pique-esconde? Tá com você!”
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