Sim, meu filho, eu posso esperar

Eu corro e, muito provavelmente, você também corre. A não ser que você faça parte daquela privilegiadíssima parte da população que leva tudo numa boa, que não se aperta nunca, você anda por aí com pressa, correndo contra o tempo pra conciliar tudo: tudo o que você precisa fazer com tudo o que você quer fazer. No meu caso, a pressa já se transformou numa coisa grave, meio crônica, porque eu tenho pressa até quando não precisa. Tem nome isso, é a Síndrome da Pressa, mal desse nosso tempo. 

Dia desses eu cheguei em casa, de tardinha, com os dois meninos e não tínhamos nenhum compromisso pela frente. Tudo o que precisávamos fazer era brincar, lanchar, tomar banho e dormir. Na hora do banho, fui tirando a roupa do menino no ritmo de sempre, e ele quis saber: “Onde a gente vai?”; “Em lugar nenhum”, respondi, ainda sem entender o x da questão. “Mas a gente tá atrasado?”; “Não. Por quê?” “Porque eu queria tirar a minha roupa. Você pode esperar, mãe?” Eu fiquei quieta, nem respondi em palavras porque não saberia o que dizer. Recuei, sorri sem graça, e fiquei vendo ele fazer o que queria, no ritmo dele. Fiquei pensando no quanto custa pra uma criança esse estilo de vida que a gente leva - e olha que eu nem moro em capital com quilômetros de engarrafamento e nem temos agenda cheia o tempo todo. Custa caro.

Preciso considerar que não posso, de fato, relaxar o tempo todo e deixar que eles façam tudo a Deus dará, sempre, porque senão ninguém chega na escola, ninguém chega no trabalho, ninguém sai de casa nem pra passear. Ritmo e rotina são duas coisas boas, tenho certeza, mas tem hora que é preciso mudar o ritmo e sair da rotina pra conseguir enxergar. Não faz muito tempo, o menino comentou comigo que fulano, ciclano e beltrano, amigos da escola, se calçam sozinhos. Não era uma reclamação, mas me caiu então a ficha. Ele, até ali, não tinha desenvolvido habilidade para colocar sozinho a meia e o tênis e a razão era simples: mal tinha tido oportunidade. Com pressa, a mãe aqui, preocupada em ensinar "coisas sobre o céu, a terra, a água e o ar", não dava o tempo - e o incentivo - que ele precisava para aprender a fazer por conta própria. Em meio a frustrações e uns minutinhos de atraso, estamos trabalhando nisso. 

Estilo de vida não é sempre uma escolha e, portanto, a gente tem que se perdoar e tentar compensar quando for possível. Crianças, no fim das contas, são uma escola e tanto pra isso, já que nos dão novas oportunidades a cada dia. E não é de uma hora pra outra que nos curamos da tal síndrome… Depois que eu já tinha dado esses pensamentos (e este texto) por encerrados, ao menos temporariamente, o menino me deu outro recado. Ele queria ver uma foto no meu celular, e foi passando seu dedinho na tela, lentamente, procurando pela tal imagem. Eu, com pressa, enfiei meu dedo na frente, e ele reclamou. “Tô te ajudando, pra achar mais rápido”, eu me defendi. “Eu não quero ajuda, quero procurar”, ele respondeu sem se alterar. E continuou procurando, sorrindo. 

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