Saudade, substantivo futuro
/Era uma vez uma mãe exausta. Ela deu banho nos filhos, serviu o último lanche do dia, suou pra que eles comessem o último lanche do dia sem botar a cozinha abaixo, escovou dentes, pôs na cama, contou história, segurou as mãozinhas e, quando finalmente dormiram, ela, aliviada até o último fio de cabelo, foi navegar no celular. Estava escrito lá: você vai sentir saudades. Ok. Pronto. Do cansaço à culpa em dois segundos… Que horror de mãe, meu Deus, essa que torce pros filhos dormirem. Que péssima mãe essa que reclama da bagunça, da gritaria, dessa dose cavalar de vida que toma conta da casa da gente. Que coisa mais absurda querer mandar todo mundo pra casa da avó, querer passar um fim de semana sozinha na praia… Que crueldade se negar a contar mais uma historinha. Você vai sentir saudades…
Outro canto da cidade. Outra mãe. Agora é dia, sabadão, o fim de semana inteiro pela frente. A mãe peleja na hora do almoço, faz o prato perfeito entre o que a criança quer e o que ela devia querer, e nada. Resmungo, choro, careta, garfo no chão. Ela pede calma, ela tenta ficar calma, ela mostra a comida bonita, ela cheira a comida cheirosa, e o menino fala. Fala sem parar, conta caso e, se alguém pede pra ele comer, chora. “Não quero nada, só feijão”. Bebe feijão. A mãe pensa se insiste ou não no arroz, se come agora a comida dela que já tá fria ou se deixa pra daqui a mais dez minutos, e a sogra, cheia de amor, aconselha: “relaxa, minha filha. Vai ter um dia que você vai ficar morrendo de felicidade se ele der uma passadinha rápida só pra comer o seu feijão.” Um dia, 2030, talvez… Você vai sentir saudades…
Antever a saudade é importante, traz fôlego novo. Cinco ou dez minutos. Ok, ok, talvez um dia inteiro. Faz um carinho no coração, e a gente torce pra durar bastante aquela nova perspectiva - a perspectiva da saudade -, mas não é simples. Vem aí mais uma noite curta, mais um dia longo, mais uma bateria de testes e, embora a gente até veja a saudade dando as caras lá no horizonte, aqui, 2017, a real é outra. Sim, minha amiga, eu sei que vou sentir saudades. Obrigada por avisar. Mas, por enquanto, dá licença... tô exausta. Passa um café pra mim?