Sobre filhos, frutos, histórias...
/Plantamos uma árvore num dia nublado de 1993. Talvez 1994. Colocamos a muda já crescidinha num espaço preparado pelo meu pai no jardim que ficava em frente à nossa casa, e era tarefa da minha mãe regá-la quando não chovia. Era um flamboyant, eu me lembro ainda hoje do vermelho meio laranja das flores e do som que invadia a sala quando ventava. Aos poucos o caule foi ficando enorme, e a árvore da casa foi dando lugar à casa da árvore. As folhas faziam sombra no nosso jardim, na calçada e na varanda onde eu e minhas irmãs passávamos os dias de verão.
Quase vinte anos depois, tive meu primeiro filho. Nasceu miúdo, magríssimo, mas firme, sereno, absolutamente saudável. Um menino disposto a acolher o mundo. Na nossa primeira manhã juntos, ficou quietinho no meu colo, me olhando como se pudesse me focar claramente, enquanto eu me via refletida dentro do olho dele. Feliz, agitada, descabelada… ‘Quantas vezes ainda seus olhos vão fitar os meus?’, eu pensei. Um infinito de vezes, e ainda bem. Três anos mais tarde, outubro também, repeti o feito, outro filho, outro amor, outro menino. Nasceu no começo da tarde, forte, robusto, como diria a minha avó. E absolutamente saudável. Na nossa primeira noite juntos, dormiu em cima do meu peito, quentinho, me deixando sentir aquela respiração acolhedora enquanto eu tentava dimensionar o que estava por vir. Dele, pra vida inteira.
2017; escrevi um livro. “Mãe, por que você escreveu um livro?”, quis saber o menino, já com cinco anos de experiência nesse mundo. “Pra contar histórias pras pessoas, meu filho.” “Que histórias?” “As nossas histórias, e histórias de gente como eu e você…” “As minhas histórias?” “Sim.” “Uau! Então as minhas histórias são maneiras, né?” Sorri. Ele não faz ideia. Não sabe que são as histórias dele e de milhares de meninos e meninas como ele que fazem a história do mundo. Segue sendo menino, ainda bem, correndo com a minha blusa na mão, subindo no sofá com o pé sujo.