Te amo, mas sai daqui!

Sim, eles se amam profundamente. Fazem inclusive declarações de amor um pro outro, e eu poderia parar por aqui, pra fazer o retrato mais bonito da infância. Irmãos que se amam, que se apoiam, que torcem um pelo outro. Mas são irmãos de verdade e, entre uma brincadeira e outra, enquanto a mamãe prepara o lanche ou dá um jeito naquela gaveta, pode ser que haja um grito. Um grito ou dois, e pode ser que alguém apareça chorando, esfregando o rosto, dizendo uma frase longa que não consigo compreender bem… o que que foi? “Meu irmãaaao não me deixa…” 

Isso acontecia muito raramente, mas agora, com a “maturidade” do pequetito, que quer o mundo em condição de igualdade com o irmão, cresceram os conflitos. A mãe nunca sabe exatamente como fazer, porque não viu o problema nascer, não sabe quem fez o quê, e é muito provável que a culpa seja de ambos... "seu irmão não podia ter feito isso, mas você também, heim…!!!?" Aí muitas vezes a consequência vem pros dois, ninguém vai mais brincar com isso, ninguém vai mais ver TV, e eles acham injusto. 

Sentada num café um dia desses, sozinha e, portanto, livre pra observar o que se passava, vi duas meninas, irmãs claramente, apontando pra um revista de colorir exposta numa banca de jornal. Uma delas pôs o dedo, a outra sorriu, pegou a revista, se aproximaram, trocaram algumas palavras com ar de cumplicidade, até que uma delas decidiu virar a revista pra ver a contracapa. O timing da irmã era outro, resmungou, ficou brava, mas a menina não abriu mão, queria ver a contracapa naquela hora e, de repente, fechou o tempo. Gritaram uma com a outra, gritaram com o pai, quase rasgaram a revista e eu pensei… só muda o endereço. O rapaz ficou irritado, talvez envergonhado, saiu com as duas dali, sem a revista, e eu fui buscar meus meninos na escola. 

Na volta pra casa se estranharam porque cada um queria uma música no carro. Administramos. Depois queriam, que coincidência!, o mesmo prato pra comer bisnaguinha, e por isso o pequetito achou que devia chorar. Administramos de novo, com mais suor. Se divertiram por quase uma hora com o teatrinho que montaram num cantinho do quarto, até que o pequetito desmontou toda a cena do menino, coisa típica de quem tem dois anos, e o menino ficou bravo, irritadíssimo, e não quis saber de conversa - coisa típica de quem tem cinco anos. Encerrei a brincadeira, "vamos todos dormir", e um monte de pensamentos me vieram à cabeça, mil planos e estratégias no tempo de uma escovada de dentes. Distraí, eles correram pro quarto, deitaram juntos e eu ouvi a conversa: “quer dormir aqui comigo?” “Quero” “vou pedir pra mamãe”... 

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