Meu corpo perfeito
/“Eu adoro meu corpo”, o menino me disse entre uma pipoca e outra na noite de terça-feira. A frase me parou na mesma hora, me tirou docemente de todo o resto que eu estava fazendo e eu quis esticar o assunto. “Por que você adora?”, arrisquei. “Porque com ele eu sinto cheiro muito bem, posso comer coisa boa e tenho força pra brincar.” Bingo! Aos cinco, ele sabe o que é que conta, e eu, contra todas as evidências, tenho esperança de que isso não se perca.
Minha recordação é outra. Não me lembro nem de longe dessa sensação boa, pelo contrário. Eu não gostava do meu corpo, fazia parte do time das meninas que desde cedo estavam em guerra com a própria imagem. Mas eu era mais velha... Não sei o que pensava aos cinco, mas aos 12 eu detestava, fugia do espelho de corpo inteiro, e não era por nenhuma coisa relevante: era porque eu não tinha a barriga retinha, (achava que) não podia usar miniblusa e ficava brava se o uniforme da escola deixasse isso transparecer de alguma forma.
Aí volto o pensamento pros meus filhos. Ainda estão livres (ou quase) da violenta pressão que a sociedade certamente fará sobre eles (e talvez especialmente sobre as amigas deles) e conseguem enxergar o que vale: a potência que o nosso corpo tem. Se me perguntarem, eu sei dizer exatamente quando foi que deixei pra trás a sensação de que precisava usar blusa larga, sempre larga: 2011, logo depois que meu primeiro filho nasceu. Foi preciso ver a mais poderosa manifestação da natureza dentro do meu corpo pra eu entender que o que me determina não é aquela barriga saliente, a celulite ou sei lá o que. E não, não quero meu “corpo de volta”, como as publicações fitness insistem em oferecer. Está aqui o mesmo corpo de sempre, pode apostar… E isso não é uma apologia ao desleixo.
O pequetito, como que pra reforçar a metamorfose que o irmão dele provocou na minha forma de enxergar a mim mesma, gosta do corpo a corpo. Adora encostar, quer ficar de mãos dadas enquanto come, quer deitar a cabeça em cima da minha mão pra pegar no sono. Quando está relaxado, gosta de brincar com a minha barriga. Aperta, faz carinho, às vezes dá beijo, usa de travesseiro, abraça e chama de “barriguinha linda”, sem nunca mencionar a gordura localizada ou a cicatriz que está aqui desde a minha infância. Acho que ele nem nota.