A mãe nervosa (e a culpa que dá)
/Uma amiga me disse hoje cedo que não é a mãe que ela queria ser. Anda nervosa demais, cansada, irritada, levantando a voz com as crianças sem (muito) motivo, caindo nas provocações típicas dos pequenos e, por conta disso, está chateada. Pra ela, isso anda assim porque ela trabalha muito, desde sempre, desde que os filhos nasceram e, por causa da dinâmica do dia a dia, tem pouco tempo pra diversão - acaba ficando com a parte dura do negócio, “vai tomar banho, escova os dentes, veste o pijama”, e aí não tem relação que resista. Claro, não é fácil, e ela estava tomada pela culpa…
Mas não é só ela: na semana passada, a amiga de uma amiga se queixava da rotina em casa, afirmava que seria mais fácil se ela pelo menos tivesse a chance de sair um pouco mais daquela correria, se tivesse um emprego, se seu dia não se resumisse a cuidar dos filhos. “Mas eu não tenho respiro, isso me cansa, isso me irrita, e acabo descontando neles as minhas frustrações”, ela concluia, relatando no fim das contas uma rotina de estresse e insatisfação muito parecida com a que me descreveu minha amiga esta manhã. Estava tomada pela culpa.
E eu? Ando tomada pela culpa. Já trabalhei muito fora de casa, já não trabalhei (fora de casa), já trabalhei pouco (fora de casa), e o estresse, o nervoso, “a mãe que eu não quero ser”, andaram juntinho comigo. Pra lá e para cá. Suspeito que seja porque, na fase A ou B, eu sempre trabalhei muito dentro de casa. Sem descanso. Diria que desde a hora que eu acordo até a hora que durmo, isso quando não trabalho durante o sono também. Não existe chance de eu me desligar completamente das obrigações, responsabilidades e até dos prazeres da maternidade - embora seja uma delícia dar uma relaxada - e o que eu concluo é que a “mãe que eu não quero ser” faz parte da “mãe que eu sou”, e a gente precisa aprender a lidar com isso. Quem sabe assim ela não vai tirando o time de campo?
Ontem no almoço me estressei mais do que precisava, eu acho, com a enrolação que eles arrumam à mesa, e agi como não queria: fechei a cara, cortei a conversa, dirigi de mau humor. Já na porta da sala, muita auto análise em ação, achei que devia pedir desculpas ao menino, e ele sorriu com doçura. Com o pequetito me desculpei com abraço e dezenas de beijos, ao que ele respondeu gargalhando “que mamãe doida!”. Mas na saída da escola, de novo cansada e irritada com os rompantes de mau-humor (e mau-comportamento) do menino, ouvi dele, sem tirar nem por: “você é a pior mãe do mundo”. Eu já fui a melhor, eleita pelo mesmo júri, então fiquei calma. Ele dizia isso porque eu neguei a pipoca que fica sempre parada na porta da escola, e eu neguei porque não posso e não vou comprar pipoca todo dia. Viemos pra casa - os dois e eu, “a mãe que eu não quero ser”. Tentei responder com carinho, me desdobrei, me acalmei como pude. Dormimos, e eu esqueci disso. Hoje cedo, banho tomado, ele disse que queria me falar uma coisa. “Diga!” “Desculpa te chamar de pior mãe. A gente às vezes faz o que não quer fazer.”