Dia 51/52

O ideal seria que esse último domingo de férias tivesse sido da mais absoluta paz, mas não é exatamente o que se passou. Eu tinha uma lista mental de tudo o que precisava fazer pra começar bem a maratona escolar - entenda, por favor: com a geladeira abastecida, as mochilas preparadas e o espírito animado -, mas a noite mal dormida me deixou quebrada, a lotação do supermercado me mostrou que muita gente teve a mesma ideia que eu, e, muito especialmente, meu pequetito usou toda a manhã e a hora do almoço pra uma rica demonstração de que não há planejamento que se garanta diante de uma criança de 4 anos (pro caso de eu estar esquecendo). Chorou, quis brincar só com o que não podia, e quando eventualmente podia se irritava, chorava mais, e levava o irmão naquela vibe ruim, brigavam, eu respirava fundo. Pedi até por favor pra que ele almoçasse, "está todo mundo aqui, a vovó, a titia", e ele comeu, mas comeu o que quis, no ritmo que quis… 

Logo que terminou já foi me pedindo o picolé, um picolé de fruta que tínhamos preparado de véspera pra ser nossa sobremesa neste dia quentíssimo, e eu pensei num jogo duro, mas cedi por uma mistura de calor e cansaço. Ele pegou o picolé da minha mão, ouviu de costas o meu pedido pra ficar na varanda , "senta lá porque isso vai pingar", e eu fui tirar a mesa, pratos, copos, sobrou carne, sobrou arroz. Quando olhei de novo lá estava ele sozinho na varanda, olhando pra frente, no finalzinho do picolé que tanto quis. Peguei mais um no congelador, cheguei lá perto, perguntei "quer mais?", e ele mostrou os dentinhos pra provar que sim. Alcancei nos olhos dele a pista de skate, que a gente vê daqui da varanda, e a piscina cheia de crianças saudavelmente barulhentas, e antes que eu perguntasse ele disse: "mãe, quando eu vejo eles eu tenho vontade de andar de skate. Quando eu tiver 10 anos eu vou poder, né?" Eu disse que sim, sem entrar no mérito de que na verdade pode até antes, e disse "então é nisso que você está pensando?" Ele mordeu mais um pedacinho do picolé de cajú, e me disse "estou pensando em como a vida vai ser quando eu crescer."