A dona da festa
/Essa aí da foto sou eu, feliz da vida, na festa do meu aniversário de 4 anos. A festa foi na minha casa, coisa muito comum em 1984, e não tinha pula-pula. Também não tinha doce com meu nome escrito nele e nem lembrancinha personalizada pros meus convidados. Quem foi lá brincar comigo provavelmente foi pra casa com um punhado de balas de coco na mão, aquelas que eram embrulhadas num papel com franja. A gente se amontoava na sala, corria de um lado para o outro, suava, brincava de pique no quintal e depois cantava parabéns nessa mesa aí, cheia de gelatina.
Os tempos são outros, é claro. Há alguns dias celebramos o aniversário dos meninos e, desta vez, tinha dezenas de doces temáticos, com iniciais de pasta americana feitos com o maior capricho por profissionais cujo talento me deixa tão grata quanto boquiaberta. À disposição das crianças tinha um monte de brinquedos de criança - o que talvez seja o maior ganho da festas infantis ao longo dessas três décadas. Também tinha lembrancinha pros convidados, tudo, até certo ponto, dentro do modelo 2015 que, se a gente não tomar muito cuidado, fica até parecendo que é o único modelo possível. Lá pelas tantas, porém, eu olhei pra cara feliz do meu filho mais velho, que completou também 4 anos, e vi o que as duas festas tinham em comum: ele. A essência da criança.
Doces, salgados e um punhado de bolas de soprar só fazem sentido se junto com eles houver espaço para que o dono da festa - ou os donos, como era o nosso caso - possa ser ele mesmo e possa conduzir a comemoração da forma que bem entender. Dia desses, sentada na minha mesa de trabalho, pude observar pela janela um grupo que tentava, aproveitando a grama verde, fotografar o que, a julgar pelas placas e cartazes, parecia ser o álbum de 1 ano de uma menina. Ela, claro, mal ficava em pé sozinha, mas, entre caretas e resmungos, precisou lidar com uma roupa que lhe cobria quase o corpo todo, parecendo ora uma fantasia de bailarina, ora uma réplica do bolo que, minutos depois, ela foi “convidada” a degustar (ou cair de boca), apesar da óbvia inadequação do cardápio para um bebê e do desconforto dela. As fotos, claro, eram uma celebração para os adultos.
Alguém certamente dirá que faz parte e que, por que não?, toda família quer ter essas recordações… Mas a foto sairá muito mais bonita, pode apostar, se as famílias descobrirem maneiras de construir essas recordações de forma respeitosa e coerente com as possibilidades de homenageado. No último domingo, para citar um exemplo, festejamos lindamente o aniversário de 5 anos da filha de uma amiga com um piquenique no parque. A escolha foi feita por ela, que não gosta das “brincadeira do salão”, mas adora o romantismo de um lanche em cima da toalha.
A questão é que o modelo 2015 (que, na verdade, vem se repetindo ao longo dos últimos anos) tem feito famílias gastarem rios de dinheiro com festas, álbuns e outros produtos que podem fazer sentido para os convidados, mas pouco interferem no que uma criança de 2 ou 3 anos vai levar consigo quando a data passar. Festejar, para uma criança pequena, tem certamente muito mais a ver com se sentir amada e livre para brincar como quiser do que com personagens desenhados em doces que ela nem vai comer e lembrancinhas cada vez mais elaboradas. O perigo é, com o passar dos anos, a gente acabar convencendo-as do contrário…